O Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais)
vai trocar sua tradicional farda preta, nas operações diurnas, por um
moderno camuflado digitalizado verde. A mudança deve ocorrer já em
2012.
O padrão escolhido para ser o principal uniforme da tropa de elite da Polícia Militar do Rio é o camuflado digital de florestas, usado pelos fuzileiros navais dos Estados Unidos. É considerado o mais adequado ao perfil “multitarefas” da unidade, que atua tanto nas matas próximas a favelas como no ambiente urbano.
O uniforme preto, porém, não vai ser abandonado. Continuará a ser empregado pelo Grupo de Resgate e Retomada de Reféns (GRR) e pela tropa, em operações à noite.
A substituição da farda que celebrizou o Bope vinha sendo estudada
desde 2007, por motivos de segurança e de saúde dos policiais. A roupa
escura, embora faça parte da mística dos “homens de preto”,
paradoxalmente põe em risco a vida dos “caveiras” – como são conhecidos
os “cursados” em operações especiais.
A farda negra é facilmente identificável à distância durante o dia,
pelo contraste da cor com o ambiente, e até à noite, quando “faz
silhueta”, expondo os PMs. Outro ponto negativo que foi levado em
consideração é que a camisa e as calças pretas acumulam muito calor, sob
o forte sol fluminense. Frequentemente provocam desidratação e
intermação (elevação da temperatura do corpo pelo calor excessivo), com
mal-estar e desmaios aos soldados.
Atual comandante do Choque, o "caveira" Fábio fez estudo sobre a nova farda |
“A cor preta contrasta-se facilmente com qualquer cor à
exceção dela mesma. O policial fardado de preto pode ser plotado à
distância, tornando-se um alvo fácil no ambiente operacional”, afirma
estudo do tenente-coronel PM Fábio Souza,
para o Curso Superior de Polícia, que ajudou a embasar tecnicamente a
decisão. Atualmente comandante do Batalhão de Choque, Fábio é “caveira”
do Curso de Operações Especiais (COEsp) de 1996 e integrou o Bope por 13
anos, a maior parte de sua carreira.
No trabalho “Desempenho Operacional do uniforme de Combate
Digitalizado nas Áreas de Risco do Rio de Janeiro”, o oficial aponta
cientificamente as muitas desvantagens da farda negra em comparação com a
camuflada digital.
Experiências práticas de policiais do próprio Bope com diferentes
uniformes mostraram que deslocamentos feitos usando o camuflado digital
retardam a visualização à distância, tanto a olho nu quanto com o
auxílio de lunetas.
Novo uniforme, camuflado, vai substituir o tradicional dos "homens de preto" |
O atual chefe do Estado-Maior Operacional, coronel Alberto Pinheiro Neto, estava à frente do Bope em 2007 e já defendia a mudança do uniforme, ao lado do seu subcomandante, Renê Alonso, atual comandante da unidade.
No novo cargo, abaixo apenas do comandante-geral, Pinheiro Neto tem
mais autonomia para implantar a alteração. “Estamos trabalhando para que
seja implementado este ano”, afirmou o coronel.
“Uniforme preto é totalmente divorciado do contexto operacional”, diz trabalho
Em seu estudo, Fábio é contundente. “A utilização do uniforme de
combate digitalizado em operações policiais diurnas é a opção mais
recomendável para o ambiente operacional encontrado no Rio de Janeiro,
em comparação ao uniforme preto usado atualmente. Os resultados (dos
testes) demonstraram que o uniforme preto é totalmente divorciado do
contexto operacional a que está submetido. Por outro lado, o uniforme de
combate digitalizado atendeu totalmente as expectativas operacionais”,
escreveu ele.
Homens de preto em ação, na ocupação da Vila Cruzeiro. Uniforme escuro ainda será usado em resgate de reféns e à noite |
Nem sempre os soldados do Bope se vestiram da cor preta, só
adotada em 1992. Antes – desde sua criação, em 1978, como Nucoe (Núcleo
de Operações Especiais) – a farda era azul marinho. A decisão de adotar a
farda preta, porém, não foi embasada em nenhum estudo.
Foi baseada no uniforme do SAS (Special Air Service), tropa de elite
do Exército Britânico, que invadiu a embaixada do Irã em Londres, tomada
por terroristas, em 1980. Nesse caso, o uso do fardamento totalmente
preto era uma arma psicológica para intimidar o inimigo, dando aos
soldados o aspecto de “um ser desumano”, diz o tenente-coronel Fábio, no
trabalho.
O oficial, que usou a farda por tantos anos, porém, diz que, além do
ambiente operacional completamente diverso daquele no qual se inspirou, o
“clima tropical” do Rio é um agravante, conjugado ao peso de
equipamento. “No universo das operações policiais diurnas, o uso do
uniforme preto se torna um sacrifício extra, com possíveis casos reais
de desidratação e intermação. É uma emergência clínica com alto risco de
morte”, afirma.
O cabo Ananias, há 11 anos no Bope, lembra-se bem de passar mal dentro do blindado “Caveirão”, durante operação no verão, na Vila Cruzeiro, no Complexo da Penha. “Estava um inferno, a bala voando, e um calor insuportável, com todo mundo passando mal dentro do blindado, sem poder sair, porque o tiro estava comendo lá fora”, lembra.
Curiosamente, apesar do uso corriqueiro e célebre, até hoje a farda preta do Bope não faz parte dos uniformes oficiais da PM.
Nunes admite que a mudança de cor pode causar estranheza, no primeiro momento, mesmo entre os policiais.
“Vai causar estranheza porque é uma marca, mas o preto não acabou. É
uma ferramenta a mais para a qualidade do serviço”, disse. “Quem fez a
mística do Bope não foi o uniforme, mas o combatente. E hoje o preto não
é mais exclusividade nossa, até segurança do Metrô usa... Tenho de
privilegiar a saúde e a qualidade do serviço, dando mais segurança e
saúde física ao PM, para ele trabalhar mais tempo e melhor. Vestindo
preto, amarelo ou paisano, é o Bope.”
Alta tecnologia no novo uniforme
Para a farda vestir perfeitamente no soldado, o Bope vem
estudando a mudança há um ano, e foi contratada a consultoria do
Senai/Cetiqt, especializado em uniformes.
A modelagem foi especificada de forma tão detalhada que as
especificações das gandolas (camisas) tomam 24 páginas, e as das calças,
mais 26. São informações como tipo de costuras, fios e as distâncias
entre bolsos, posições dos velcros, por exemplo.
O tecido a ser usado é de alta tecnologia: permite a passagem de ar,
para não esquentar demais e tem resistência a fogo. Até o fim de
janeiro, chegam ao Bope 60 uniformes de empresa norte-americana – que
fornece material a militares dos EUA, Noruega, Itália e Austrália – para
teste.
“Não tem prova melhor que a avaliação dos meus policiais, rastejando
no chão e arrastando a farda nos becos”, diz o major Nunes, chefe de
Logística do Bope.
A tecnologia não impede, porém, a desconfiança dos soldados do
própria tropa de elite. “Farda feia para caramba!”, disse um PM. “Vai
ser esta a farda?”, perguntou outro, curioso. “Uso a minha, preta, a
vida toda. Para que trocar?”, questionou um terceiro.
Os conjuntos de camisa e calça devem custar ao Bope de R$ 250 a R$
300. Os cerca de 400 policiais do Bope vão receber dois conjuntos de
camisa e calças camufladas e um conjunto de farda preta, também feito
com o novo material – no total de 1.200 a 1.500 uniformes.
O orçamento já está reservado, e a licitação acontecerá nos próximos meses.
Fonte:IG
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